quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

Serenidade das Orquídeas


A serenidade

Os contos que compõe “A serenidade das Orquídeas” não são inéditos, foram publicados originalmente no meu blog “Avida reinventada e outras histórias” entre 2006 e 2010. Escolhi os contos que mais gosto para compor este livro, pequenas histórias que mostram o insólito das nossas relações cotidianas.
Em cada conto sentimentos de um mundo que acontece por dentro e nos assusta por fora. Gosto da ideia de escrever pela ordem do caos, da possibilidade de ampliar pequenos delírios até ao absurdo que choca, mas sem perder com a realidade a ficção de existir.
Este livro também faz parte do meu esforço pessoal para editar meus livros e levá-los ao maior número possível de leitores, deixá-los em bibliotecas públicas e particulares para que no futuro aconteça, quem sabe,à alegria de encontrar leitores, afinal é essa a finalidade de cada livro, encontrar leitores e assim possa existir como livro, como arte.
Ediney Santana
Brasília, 28 de novembro de 2014



terça-feira, 6 de janeiro de 2015

1ª Entrevista- Literatura Brasileira


Universidade Estadual de Feira de Santana
Departamento de Letras e Artes
Campus Avançado de Santo Amaro-Bahia







Linguagem da Arte
Poesia



Aline Mota
Itana Fonseca
Luana Veiga
Railda Cruz
Vilma  Barbosa




Santo Amaro
Maio de 2003

O POETA PELO POETA


Ediney Santana, de origem sertaneja, se descobre poeta no recôncavo baiano. Como todo poeta, tem na solidão a companhia perfeita para seus momentos de inspiração, de encontro consigo mesmo “hoje estou ausente de mim...”. Existencialista? Por que não?
Nascido em 14/03/1974, na cidade de Mundo Novo-Ba, filho de Zelina Santana e Edivaldo J. da Silva. Em virtude do trabalho de seu pai que foi transferido do distrito de Capivara – Itaberaba/BA, para Santo Amaro, veio morar nessa cidade e no prédio onde funcionou a antiga estação ferroviária e depois a Direc-31.
Estamos neste momento no Campus Avançado de Santo Amaro/UEFES, nos concedeu entrevista:
1º momento – 30/04/2003
Aline – Por que razão você começou a escrever?
Ediney Santana – Eu não lembro porque já tem muito tempo, mas as coisas mais antigas que tenho datam de quando eu tinha doze anos mais ou menos.
Aline – Você falou que começou a escrever com doze anos, mas quando começou a sua escrita... Você se descobriu poeta ou sentiu uma necessidade ou de repente você escrevia e mais tarde se deu conta de que aquilo era uma Poesia, ou apenas escrevia e não identificava o que aquilo era?
Ediney Santana – Olha só, digamos que eu tive uma infância pelo avesso, não gostava muito de fazer os que as pessoas da minha idade faziam: jogar bola, etc. Não gostava de andar com os meninos da minha idade, gostava de ficar lendo revistinhas, lia muito a bíblia e sentia vontade de questionar aquelas coisas, e como não gostava de andar com as pessoas de minha idade, tinha tendência a conversar com pessoas mais velhas, então chegavam novidades. Se por um lado para os garotos lá da rua eu era esquisito, essas pessoas mais velhas já me viam com outros olhos. A partir disso fui jogado de lado, então comecei a ficar ‘na minha’, a rabiscar no caderno, escrever, na escola me aproximava dos professores de português e começava a fazer versos, mas não com aquela coisa de Poesia. A palavra Poesia não tinha aparecido na minha vida. Talvez por uma infância solidária eu tenha chegado nas letras.
 Morava perto de uma banquinha de revista e mais tarde passei a vender jornal e isso possibilitou minha aproximação com a Literatura porque por aí descobri as partes culturais do jornal, eu não entendia muito bem, mas fiquei aficionado a ler, ler, ler, sempre com aquela interrogação e escrevia meus versos, textos. Era uma coisa que questionamento mesmo.
Aline – Você diz “não quero ser exemplo, não quero transformar, não quero ser lido”. O que é o processo da criação literária para você? O que significa ser poeta, ser o poeta Ediney Santana?
Ediney Santana – Para mim a Literatura na Poesia tem uma função clara, aliás, duas funções: marcar minha época e dizer as coisas que penso desse tempo de hoje, nosso tempo, e o outro é... Digamos que embora eu tenha dito que não quero ser lido, não é nada disso, porque penso que minha função não é que as pessoas leiam e passem a escrever igual, nada disso. Mas que elas se tornem senhoras e senhores de si, que vão procurando seu caminho, vendo que há possibilidades. Se um sujeito escreve lá seus versinhos em sua infância e depois consegue publicar, outras pessoas vão escrever não aquilo, mas digamos ter ânimo para escrever, ir em frente, para questionar. Vivenciar Poesia para mim é quebrar essas barreiras, é mostrar que qualquer pessoa pode publicar um livro, escrever um poema, um romance, desde que ela não se prenda, não se feche. Sabe aquela ideia romântica de que sou o máximo e ninguém mais presta? Então talvez por isso eu tenha escrito essas questões... De não ter barreiras, não ter raça, uma poesia que aponte para um caminho de liberdade.
Aline – Por que o título “Até que a eternidade nos uma”?
Ediney Santana – Creio que esteja um pouco brigado com a minha época. Se você prestar atenção são poesias negativas. Não vai ter texto para a pessoa ler e se emocionar e mandar para os amigos; não vejo com bons olhos essa época. Desde quando eu estou brigado com a minha época, nada mais sugestivo do que “Até que a eternidade nos uma”, ou seja, no momento não creio que a possibilidade de a coisa ser bem aceita porque aquela concepção de beleza, do belo da Arte eu não coloquei na poesia do livro, são versos ácidos, embora aparentemente alguns leves, mas é um descontentamento com essa época, um livro de negatividades, não é de afirmações nem de celebrações, é ‘olha, não to muito satisfeito... ’.
Aline – Nos dois poemas “Silêncio” e “Até que a eternidade nos uma” aparece uma referência à morte refletindo uma ideia de sofrimento, dor. Você sofreu alguma perda que foi significante para sua poesia?
Ediney Santana – Essa questão de morte não é física, que a pessoa deixa de existir como no romantismo, é a morte ideológica, poética, a morte das relações mais sérias, ou seja, um ambiente onde nada é sério, não há uma ‘verdade’ que você possa se apegar muito. A morte da beleza e o surgimento do grotesco. A morte social de cada indivíduo. Cada um de nós tem que ficar o tempo todo fingindo, interpretando, assumindo posturas que não são nossas. Isso de certa forma é uma morte da pessoa, ter que desviar caminhos para chegar a algum lugar, ter que esconder sentimentos, pensamentos. Morte no sentido social, amoroso, sentimental, político. O engraçado da poesia é que ela se nutre dos seus dramas, não das suas conquistas, sim das suas derrotas, questionamentos.
Aline – Sabemos que você além de ser poeta tem uma vida política ativa, tem uma tendência a lutar pelas causas sociais. Qual é a diferença que existe (se existe) entre o poeta Ediney e o homem Ediney?
Ediney Santana – Sou mais otimista estando aqui conversando do que escrevendo. Sou positivo o tempo todo, tanto que me envolvo em questões políticas e se você se envolve acredita que pode mudar, mas quando escrevo vem à tona a decepção disso, a parte da tristeza mesmo, de lutar, lutar, querer e não chegar a lugar nenhum, voltar para casa apagar a luz e ver que daquilo foi tudo em vão. Talvez no livro eu dê mais vazão às angústias que disfarço no dia a dia, mas também eu não sou uma pessoa muito alegre. Então a diferença entre um e outro é bem fraquinha.
Aline – Queríamos saber se você enquanto poeta, se você brinca com as palavras? Acontece uma brincadeira consciente ou inconsciente?
Ediney Santana – É consciente, adoro brincar com palavras, adoro metáforas. Do título até o último poema é cheio de metáforas. Adoro usar trocadilhos, pegar uma palavra comum do dia a dia e colocá-la num contexto onde ela assuma outra conotação, às vezes com um pouquinho de acidez, com humor, mas aquele humor terrível. Então é proposital.
Aline – Você diz: “estamos no vácuo, no nada, tudo está errado, tudo é ímpar. Deus é o vazio, o nada. O eterno vem depois da não existência. O eterno é o dia depois de ontem.” Você se considera um poeta do absurdo? Do absurdo de existir, de ser, de não ser, de entender-se poeira desvairada a mercê do desespero e da dor?
Ediney Santana –Constantemente ouço as pessoas dizerem que sou um cara contraditório, se contradição fosse absurdo creio que seja verdade. Agora absurdo também não é aquela coisa ilógica... Esse poema “Matemático do vazio” eu fiz para um ex-professor meu, Panajotes. Mas há algumas coisas absurdas. De primeira vista uma pessoa religiosa vai dizer assim “poxa! Deus é o vazio?” Mas, para mim que sou ateu é estar negando a existência, Deus é o vazio. É uma ideia absurda para dizer que não acredito no absurdo da religião.
Aline – Como você enxerga a questão das influências que sofremos no campo literário? Até que ponto isso atrapalha a criação?
Ediney Santana – Penso que todas as influências são positivas, penso que negativo mesmo não são as influências literárias, no caso de nós que somos estudantes, negativa é a presença da Universidade nisso tudo. A Universidade tende a manter a criatividade do sujeito, tende a impor. Quando alguém começa a escrever há determinados seguimentos na Universidade que forçam você a dizem amém para outros escritores. Aí é uma coisa absurda. Ele nega ao aluno, principalmente de letras, ele floresce, buscar o próprio caminho. Se observarmos todos os grandes poetas e escritores, algum dia levantaram a voz contra algo, contra alguém e por isso acabaram se afirmando. Claro que com grande genialidade poética também. Se você reparar as aulas de Literatura nas Universidades são as que os alunos mais odeiam e o ódio nesse caso advém da má condução da Universidade nisso, que trata a Literatura como uma coisa muito séria. Literatura é Arte, acima de tudo é Arte, não é matemática nem linguística. Está ligado ao sentimento de cada pessoa. Claro que há coisas a seguir quando estudamos, mas não deveria perder isso de Arte. O professor sugere um livro de Machado de Assis, receita-o como um medicamento, como se fosse observar códigos matemáticos, a pessoa toma pavor, nunca mais vai ler e vai dizer que é chato, vai perder uma grande oportunidade de conhecer aquele escritor. Então a Universidade ‘peca’, pois se tomou um lugar de heróis da cultura de pé de barro.
Querem comprovar o que falo? Peguem os períodos da Universidade, é insuportável, duvido que alguém consiga chegar na quinta página, tratam a Arte, coisa tão bela, que vem de forma tão simples, como se fosse um compêndio que não vai levar para lugar nenhum. Quando estudei fui um crítico mortal, mordaz da Universidade. Várias vezes briguei com professores porque esta postura acaba afastando as pessoas da leitura. Ruins são essas influências negativas que o ambiente universitário tenta encurtar na cabeça. Para mim ser culto é estar atento a todas as nuanças e variações da vida, do dia a dia. Estar vivo.
Aline – Você cursou Letras Vernáculas na UEFS e o que você pôde tirar de proveito para suas poesias?
Ediney Santana – Foi proveitoso porque tive acesso a coisas não muito fáceis de achar no cotidiano, acesso a alguns livros, alguns professores que fizeram total diferença. Infelizmente os professores de segundo grau não tem muito ânimo para ensinar, talvez por cansaço ou qualquer outra coisa. Então tive professores aqui que quebraram a regra disso que falei a pouco, isso foram alguns, a outra parte foram pessoas bem humanizadas que incentivaram. Se vocês perceberem esse livro não foi do Departamento de Letras, ele foi projeto do professor Anchieta Nery, que não mexeu em uma vírgula. Se fosse do outro lado, tudo mudaria, do título aos pontos parágrafos. Então foi proveitoso porque pude conhecer outra face da vida, das pessoas e isso me deu mais maturidade.
Aline – Notamos uma preocupação constante com o aspecto político das teias sociais em seus versos. Uma preocupação humanista, muito forte, essa indignação tem raízes em uma vivência ou é uma propensa natural a esses assuntos?
Ediney Santana – Tenho militância política há muitos anos, faço parte do Partido Comunista do Brasil, do qual sou secretário político aqui em Santo Amaro, antes disso militei no Movimento Estudantil. Por ter vindo do sertão, e ter percebido como a política pode ser perversa contra as pessoas, quanto um dedo de mau político pode desgraçar a vida de dezenas e dezenas de pessoas e por lá em casa meus pais sempre discutirem essas questões... Minhas viagens pelo sertão vendo as pessoas morrerem de fome, sempre teve uma tendência forte para mim, fora o partido e obviamente procuro registrar poeticamente e nos meus movimentos e crônicas como uma denúncia, mas tendo cuidado de não transformar a Poesia em jornalismo, para que ela não tenha data de validade. Ou seja, se você prestar atenção, os versos retratam dramas humanos mais que políticos de qualquer época, de qualquer povo.
Aline – Você possui um lirismo sutil “Minha flor de dores reais”, “enaltece teu desejo de mim, negando o que tem em ti perpetuado está”. Você faz referência a várias pessoas em seu livro “Até que a eternidade nos uma”, mas notamos uma pessoa em especial que implicitamente aparece em muitos poemas, essa pessoa é Mara Wellás. Gostaríamos de saber quem é Mara Wellás.
Ediney Santana – Mara Wellás é uma menina de vinte e cinco anos que conheço há dez anos que está comigo, frequentava o chafariz comigo... Inicialmente éramos inimigos, depois ficamos amigos, depois nos apaixonamos, uns sete anos mais ou menos e recentemente estamos descobrindo aos poucos que estamos virando amigos de novo, mas sem guerra.
 É uma pessoa daquele tipo Inesquecível, inesquecível mesmo. Em todas as coisas eu tento marcar não só ela, mas pessoas legais, que somam. A Mara talvez tenha sido a primeira pessoa que tenha prestado atenção em mim, entendido os meus lanches, até então para os meus poucos amigos eu era só um sujeito deprimido, inquieto, esquisito, que gostava de ficar em casa lendo. Mara não, ela começou a ver a sutiliza das coisas, começou a ter um contato sério e não sério comigo. Começou a ver que eu não era um cara ‘só isso’, que eu tinha mais. Então eu a respeito e amo muito, por ela ter prestado atenção lá no fundo do meu coração... Por isso tento sempre tê-la por perto, seja como namorada, amiga, conhecida, como tudo. Por esses aspectos, é uma pessoa que marcou porque foi a primeira realmente que viu que eu não era só aquele sujeito ‘deprê’.
Aline – Por vezes você se mostra saudoso. Do que você tem saudade?
Ediney Santana – De muita coisa, mas eu tenho uma necessidade gritante de futuro, tudo que faço é nesse sentido. Quando eu tinha dez anos, ficava doido para ter quinze, quando tinha quinze ficava doido para ter dezoito e agora que tenho vinte e nove (risos) fico doido para ver se chego do futuro, gosto de me projetar. Mas também tenho saudade das coisas que não vivi, saudade da terra onde nasci.
Aline – Em que sentido você diz que seus versos são negativos?
Ediney Santana – De não serem poemas em sua maioria que indiquem caminhos, positivo é aquilo que lhe dá solução. Nesse caso não acontece. O livro apenas mostra pontos de vista, apenas pontos de vista. Agora em cima disso a pessoa pode ler e teorizar milhões de coisas...
Aline – Você fala como se qualquer coisa que trouxesse satisfação na vida fosse só ilusão, as únicas coisas reais seriam a tristeza e a melancolia?
Ediney Santana – Não é que pense que tudo tem um lado ruim, mas ao observarmos a lei natural das coisas tudo tem um fim. Como sou ateu acredito que tudo tem começo, meio e fim. Não acredito em amor eterno, não acredito em amizade eterna, não acredito que nada seja eterno. Talvez isso passe um lado melancólico, se você é religiosa, quando esgotam as frações humanas de respostas para suas angústias você pensa em Deus, para um sujeito que não acredita, quando esgotam as potencialidades, é ele mesmo. Sou eu e eu mesmo, ou me resolvo ou não me resolvo.
Aline – Então de certa forma o poeta em si seria um individualista?
Ediney Santana – Creio que não, materialista. Sou eu e meu mundo. Mas meu mundo é aqui na Terra, meu mundo é você, ela... Agora não repreendo essas questões religiosas de maneira alguma, posso discutir religião mas não discuto fé, fé você tem ou não tem. Mas eu sou materialista, tanto que tenho a preocupação social e é nessa parte que minha sensibilidade ecoa e nessas horas é impossível, tenho que concordar, não se sentir só, é um momento em que voz humana não vai resolver.

2º momento – 21/05/2003
Aline – Você já se sentiu sozinho na vida?
Ediney Santana – Bem, ahn... Falando seriamente, acredito piamente que todas as pessoas estão sempre, sempre, sempre sozinhas, e como eu me incluo nisso, desde a minha infância que a melhor companheira é a solidão.
Aline – Reflita um pouco e diga-nos qual a coisa mais importante do mundo para o poeta e para o homem Ediney Santana.
Ediney Santana – Para mim o mais importante não e a minha mãe, não sou eu, não são vocês, não é a professora Nádia, não é meu diploma de formatura em Letras. Para mim a coisa mais importante que tenho no mundo é o que eu não tenho ainda, é o dia de amanha.
Aline – Como pessoa o que você desejaria alcançar?
Ediney Santana – Materialmente, um emprego que possibilitasse meus livros, meus discos, um quartinho, sem cozinha. Agora, espiritualmente, filosoficamente, alguns grãozinhos de felicidade já bastariam.
Aline – Então você não é feliz? O que é felicidade para você?
Ediney Santana – Também não sei o que é. Mas não tenho, já que ela está ligada a... Felicidade as pessoas colocam num patamar de bem-estar, aceitação, nada dessas coisas eu tenho. Você acha que um passarinho que canta numa gaiola com as asas batendo é feliz? (Penso que a mesma coisa sou eu) Ele quer ir embora dali.
Aline – Quais foram as maiores emoções que você já teve?
Ediney Santana – Não sei porquê, mas tenho a estranha sensação que a morte gosta de ficar sempre rodando perto de mim. Desde a minha infância, dos 9 aos 29, perdi avós, pai, tios, primos, mais estranhamente comecei a lidar com isso de uma forma, não “deprê”, criei uma relação de afeição com esses meus mortos, não que eu acredite em alma, além, nada disso... Mas de um tempo para cá, eu tenho me emocionado a pensar nessa gente e escrever para essa gente, como se eles estivessem no meu quarto, falando comigo como se nunca estivessem ido embora. Pode parecer esquisito, minhas grandes relações ultimamente, não é ter contato com os vivos, é ficar relembrando meus mortos. De certa maneira, a fazer com que eles voltem à vida junto comigo lá nas minhas noites, sozinho, no meu quartinho. Não me emociono com coisas materiais, com livros, estudo, dinheiro; emociono-me com isso, gosto de ver as pessoas sorrindo ou chorando demais, é quando estão em contato com elas mesmas.
Aline – Então esses mortos são importantes para você?
Ediney Santana – São, eles me dão a dimensão real da vida, quase todos morreram jovens ou doentes Isso me alerta, mostra que nada desse mundo real vale a pena, isso não quer dizer que as pessoas devam sair por aí matando, mas eles me dão a dimensão real da vida, e a dimensão real da vida é a morte.
Aline – Linguagem, ponte ou abismo?
Ediney Santana – Ponte, foi o meu livro que trouxe vocês aqui, foi o meu livro que me aproximou da professora Nádia, então é ponte para outras coisas. Vocês podem ficar desapontadas ou não, podem nunca sequer contar comigo nessa ponte, mas ao mesmo tempo podem buscar outras coisas. A pessoa pode levar o livro e não gostar de nada, mas ver o nome de Antoine de Saint-Exupèry e querer saber quem é o escritor mesmo que não goste da referida poesia que fiz para o autor.
Aline – Você nos diz que ama e ao mesmo tempo afirma não acreditar em perenidades, ao passo que o título do seu primeiro livro é “Até que a eternidade nos uma”. O que é o amor e o eterno para você?
Ediney Santana – Esse instante aqui, agora tem amor maior? Não tem, há uma confusão muito louco entre o amor e a afeição. Sentimos afeição pelo filho, pela namorada, pelo neto, professor, mas amor está num instante maior, está perto da amizade, e a própria amizade é maior que o amor, é esse convívio aqui e agora. O eterno a que me refiro não sou eu. Mas as ideias ficam, as ideias perpassam, de certa forma todo mundo quer ser eterno – um analfabeto tem filhos, eu escrevo livros.
Aline – Você faz citação a outros escritores em seu livro. Qual o motivo dessas escolhas?
Ediney Santana – São pessoas que me tocaram em determinado momento, pessoas que me acompanharam, sempre estão lá.
Aline – Quando se escreve um poema?
Ediney Santana – Quando se escreve um poema... Eu não acredito em inspiração de um deus, um anjo que sopre no ouvido “vai Ediney, faz um versinho pra mim” (risos). É lutar com palavras, labutar todos os dias com meu papel e minha caneta. É estar “juntando” palavras.
Aline – De tantas possibilidades na Arte em meio a outras possibilidades de expressão, por que a Poesia?
Ediney Santana – Bom, tem o trabalho com música. Quem conhece e ouve, diz que não presta (risos). Então o que acontece? O que acontece com música é o que eu faço com poesia, não me preocupo em fazer coisas que me agradem aos ouvidos e aos olhos, escrevo minhas histórias... Penso que a Literatura é a Arte sublime, nenhuma outra forma de expressão é tão sublime quanto a Literatura. A Literatura é o máster de todas as Artes, onde tudo começa, onde tudo termina.
Aline – Mas podia ser Prosa. E por que Poesia?
Ediney Santana – Mas eu escrevo Prova, primeiro eu comecei com Poesia. Bom, só que...
Aline – Tudo bem, mas por que você escreve Poesia?
Ediney Santana – Porque Poesia é a melhor forma de se esconder, já que eu não preciso me expor na Poesia. Na Prosa eu tenho que estar mais presente na vida das pessoas (risos).
Aline – Do que você se esconde?
Ediney Santana – Me escondo de você, do dia, da noite. Porque não tenho verdade nenhuma, porque sou tímido, porque sou feio...
Aline – O que é belo para você?
Ediney Santana – (risos) é qualquer coisa, menos a minha pessoa. Gostaria de ir para o sertão, rolando no meio do mato, escrevendo de longe sem ninguém me olhar. Me escondo dessas coisas. Agora, falando sério, não sei o que é o belo, pelo lado filosófico da coisa, belo é o que agrada o espírito. E se agrada o espírito, não pode ser pintado, poetizado, nem escrito, demonstrado, melhorado, piorado. Existe simplesmente o belo.
Aline – Gostaríamos de saber a razão pela qual você nega o lirismo de seus versos, nega o romantismo como uma possível influência.
Ediney Santana – Um dia um professor falou que eu estava atrasado trezentos anos e minhas poesias pareciam uma Poesia de um poeta romântico. Isso de certa forma me deixou traumatizado. É isso que faz meu ser rejeitado pelas pessoas que leem, eu tenho um teor romântico muito grande. Então não é que negue, é que isso me deixa triste, não poder me comunicar com outras pessoas pela coisa que mais gosto que é a Literatura (risos).
Aline – Fale sobre sua música?
Ediney Santana – Porque começou com música, e o que aconteceu é o que acontece com os versos, não é aquela coisa de as pessoas ouvirem e gostarem, é simplesmente música, música pela música, gosto de ver meus versos cantados. É simplesmente música, como os meus versos estão virando simplesmente versos.


UM OUTRO OLHAR

A linguagem literária do poeta Ediney Santana interroga o mundo sobre sua realidade, sob sua luz, ela assume a nostalgia, a náusea de existir, o ilogismo das relações naturais e humanas, ao mesmo tempo que não apresenta solução e, ao expressar a sensação de perda diante do desaparecimento de absolutismos, de verdades, expõe uma época, uma época que traz consigo uma nova direção para o ser, no sentido de negar toda uma realidade preexistente. Seus versos beiram da esperança (“a revolução é um estado permanente na natureza”) ao desespero (“sorri, com flores nos dentes cariados de inverdades, produção angelical do terror”).
“Tudo está errado tudo é ímpar”, o poeta questiona os conceitos que lhe foram impostos, os fenômenos captados por seus sentidos e o drama da existência que explode e encontram um abismo onde acaba negando a natureza humana “estamos no vácuo, no nada”. O desaparecimento do divino sob o ponto de vista do ‘supremo’, do hierárquico tirou o sentido à vida e às coisas, mas como é necessário viver cria-se uma ‘moral’ da solidariedade humana (“é o olhar que em mim é todos nós”) e até a descoberta do social, essa descoberta da coletividade é dolorosa, notamos isso em “Pessoa X Jesus”:
“-Amai teu próximo como a ti mesmo”
- Será que vale a pena mesmo quando a alma não é pequena?”
“Profeta é consciência individual que percebe e traduz a consciência do povo” (autor desconhecido). Em sua poética o ponto de partida é a fragilidade humana numa perspectiva emotiva (uso da lírica), seu discurso se define entre a singularidade e a universidade, assumindo sua incompletude por conceber intervalos determinados pelo social, alude a outras realidades e outros textos (citação de escritores), é então processo de significação e seu tipo é um funcionamento discursivo que se cristaliza historicamente dada a dinâmica de produção artística.
“A dimensão real da vida é a morte”, numa tangência existencialista, a morte converte-se em inutilidade, em absurdo da criança, mas não e apenas uma poética do desespero, surgida das circunstâncias de um mundo em decomposição, é uma poética que nasce do conflito, como vemos em “Sublime”.
“Quando não nos percebemos parte desse sublime mundo
Não pela força da morte, mas pelas desigualdades
Impostas à porção de Deus em nós (vida)
Ah! Uma explosão de angústia se apodera da alma,
Nesse momento nascem revoluções
E as borboletas saem do casulo.”
Todas as discussões nesse fazer poético são discussões do Homem em busca da Liberdade essencial para comunicar-se com o mundo e consigo mesmo, já que para o autor Ela é o próprio homem: “eu senhor no meu caminho/ tradução de mim mesmo”. A atividade poética é uma violência voluntária, do autor para o autor, suicídio absoluto do que até então era íntimo e obscuro. “A linguagem é uma condição da existência do homem... e é poesia em estado natural”, já dizia Octávio Paz. Linguagem, sempre ponte para esse poeta, ponte para a libertação, ponte para comunicar os desejos – “vontade de ver o mundo/ vontade de viver o mundo”, lâmina mordaz – “cada verso um suicídio”, ponte para o inominado – “a vida é só uma metáfora”, ponte para as denúncias e para o notar-se linguagem – “na caatinga vive um triste livro, o livro de ser real”, o poeta que é linguagem, “a Literatura é o máster de todas as Artes, onde tudo começa, onde tudo termina” – “meus versos, minha tradução”. E é assim que percebemos a grande sensibilidade humana que é o poeta e o homem Ediney Santana.

CONCLUSÃO

Depois dos estudos realizados e as conversas com o poeta Ediney Santana, podemos ratificar que a poesia é uma forma de expressão única, subjetiva, espiritual e intelectiva, pois explicar o fenômeno literário é uma tentativa débil, é notável que não se pode  ter um conceito definitivo, ou mesmo quando se escreve uma poesia não existe padrão, cada escritor representa a sua arte de maneira peculiar.
Segundo Ediney, não existe hora nem lugar para se escrever, bem como, assim ele acredita, não existe inspiração, ele simplesmente escreve.

Desta maneira, a poesia enquanto criação, recriação de um objeto inicia-se com o poder cognitivo, inerente a cada ser humano e culmina com a capacidade de reflexão e os questionamentos do mundo e das coisas que cercam aquele que escreve.



Ediney Santana na Regional FM