Ediney Santana |
O ato de escrever?
R-
Tenho longos diálogos comigo mesmo, sempre fui assim. Desde sempre estive
ligado com meus diálogos internos, quando criança escrevia diários e ainda
escrevo, meu ato de escrever é minha carta de intenções dirigida primeiro ao
que sou, me afirmo assim como pessoa, depois penso no leitor, não ofereço ao
leitor um diário de minha vida, mas as leituras que faço da vida, das nossas
relações sociais, meu ato de escrever reflete a leitura possível do mundo,
evidentemente não é a única.
Retorno do que escreve?
Não
tenho leitores, não há neste momento pessoa alguma que pense ou esteja lendo algum poema ou conto escrito por mim, creio
que só quando uma obra é lida seu autor pode-se dizer escritor, pensando assim
não me vejo como escritor. Deixo meus livros em pontos de ônibus, bancos de
praça, enfim em qualquer, mas nunca tiver resposta. Talvez seja um tipo de
escritor diferente, o tipo que não se alimenta de leitores, mas da palavra que
escreve, não tenho problemas com isso, continuo escrevendo, importa deixar aqui
algo que embora invisível seja positivo, a invisibilidade ativa não pode ser
tirada de mim.
Por
outro lado a ideia da celebridade, do rei de Midas ainda não foi vencida,
muitas pessoas só enxergam algo quando esse rei de Midas toca e diz: é ouro,
esperava que neste século, com a internet o poder político e empresarial de
determinar quem tem direito a voz ou não fosse se não vencido ao menos
questionado. Mas isso não me desmotiva,
importante é escrever, se seu invisível sou também produtivo.
Fale mais sobre a invisibilidade?
Há um mito que só talento basta para que
alguém tenha voz, consiga ser ouvido, a ideia tosca da meritocracia. Isso é um
mito, só o talento não basta, muitas pessoas têm suas vozes silenciadas, a
depender o que se pensa não haverá visibilidade para ser ouvido. Cada geração
produz seus invisíveis, o que defendo é que não devemos nos calar diante essa
invisibilidade, não enxergar como recompensa ao que fazemos o aplauso da
platéia, antes de quaisquer coisas deve-se ter prazer com o que produzimos, eu
tenho prazer em escrever livros, claro, se reconhecido deve ser bom, ter seus
livros comentados também, mas antes disso tudo tenho prazer com esse essencial
que sai de mim e se materializa em cada palavra que escrevo.
Sua turma?
Tenho amigos, alguns, bem poucos. Mas
não faço parte de movimento artístico algum. Já cometi o erro de militância
partidária, cometer o mesmo erro na arte seria estupidez ao quadrado. Há uma
ideia ébria no ar, certa civilidade da conveniência, tudo para disfarçar a soberba
e vaidade, não sei se serei lembrado pela minha geração , isso também não me
interessa, compro muitos livros de autores contemporâneos, estou atento as
novas publicações, como leitor não vivo ilhado, como autor e pessoa cada vez
mais estou recluso, gosto desses distanciamento, de olhar tudo como um cartão
postal, desejando felicidades para todos.
Vídeos poemas?
Adoro fazer vídeos poemas, recitar meus
versos e deixar lá no youtube, é um dos meus prazeres, é minha maneira de dizer
para mim mesmo e para o mundo que estou vivo, mesmo que esse meu mundo seja dez
visualizações.
Sou inquieto, às vezes ao andar pelas
ruas falo em voz alta, as inquietações saem livres em diálogos entre esse eu
sereno e o outro eu aflito. Então os
vídeos poemas é tudo isso somado, vários tons de uma mesma canção.
Brasil de hoje?
Sectarista,
esquizofrênico e intolerante. Pode-se dizer que tudo isso é eco do passado, mas
hoje esse eco traz todo um teor de perversidade impensável para mim que fui da
geração ressaca, a que nasceu na possível utopia de um país livre da ditadura
que seria realmente democrático, mas mergulhou na ditadura do mau gosto, das
relações ácidas, da intolerância e xenofobia.
Penso que só
existe um partido no Brasil: intolerante. Grupos religiosos cretinos,
movimentos sociais cretinos, direita e esquerda cretinas. A violência
intelectual no Brasil é tão nociva quanto à física, a violência intelectual é a
estrategista moral e ética da violência que nos apavora pelas ruas, os
responsáveis por isso são todos esses agentes que inundam redes sócias de ódio
e demência política e religiosa, que estão nos partidos, templos e todo dito de
organização que pregam o ódio como argumento intelectual.
Há saída
para isso tudo?
Sempre há,
não só uma saída, mas varias, é necessário múltiplas visões políticas,
culturais e religiosas. Quanto mais o debate ser entre dois grupos esquerda ou
direita mais eles se fortalecem e continuam hegemônicos. Quem determinou que
devemos pensar apenas em duas alternativas? Nada é simplista assim, mas eles
estão corroendo todas nossas alternativas, nas universidades, por exemplo, há
uma paralisia, em especial, nos cursos de humanas ou licenciatura, quase nada
se produz, tudo é requentado, alunos supostamente bem esclarecidos se agarram
em meia dúzia de conceitos e não se permitem mais ao contraditório e isso é
para qualquer posição ideológica que tenham . A ideia de alguém ainda ter
posição ideológica é por si só trágica.
Ainda há pessoas que acreditam que o socialismo é o
caminho, quando já foi rezada a missa de 7º dia do capitalismo.
Niilista, cético?
Não desisto das
utopias positivas, não sou cético, mas não vou fundar as bases das minhas utopias
em visões de mundo que embora se acreditem pós- modernas ou qualquer outro adjetivo
da moda, para mim não diferem das velhas carcaças intelectuais de sempre. O discurso
artístico no Brasil, com alguma exceção se tornou um discurso da mendicância por
verbas pública, movimentos sociais se algemaram a governos, a esquerda não tem capital
ético para apontar minhas contradições e a direita é especializada em sexo oral
no poder, o pensamento de direita no Brasil se resume há algumas moedas jogadas
em suas caras carrancudas e ética cotada na bolsa de valores da intolerância e do
ódio.
Projetos?
Estou
terminando um novo romance, “Não olhe nos olhos”, uma história que se passa em
Brasília. A ideia é uma trilogia de histórias em que cidades sejam
protagonistas.
O primeiro
romance foi Urbem Angeli, toda narrativa se passa nessa cidade Urbem Angeli.
Agora “Não olhe nos olhos”. E continuar com meus vídeo.
Palavras
finais:
Muito
obrigado, fazer da invisibilidade algo produtivo, amor sem servilismo e alegria
sincera para todos corações.
Entrevista
concedida a Grabriely Del Fabry
Brasília, 12
de junho de 2015